Resposta do filho ao texto do pai publicado nesta coluna em 30/07/2008- “Eu tenho tanto pra lhe falar...”
_ Pai, eu tinha tanto pra conversar com o senhor, mas o senhor, pai, nunca me escutava. Eu não sabia direito como me expressar afinal, eu pouco ouvia as suas palavras. Quando o senhor vinha conversar comigo era sempre aos berros por isso, quase nunca eu o ouvia e me calava, o senhor me mandava, lembra-se?
Quando o senhor me colocava de castigo eu não achava ruim pai, porque eu sabia que o pensamento do senhor estava ligado a mim naquelas horas. Isso era bom. Eu derrubava leite, fazia birra. Era uma reação que me dominava e eu não sabia o porquê. Praticava e me entristecia ao mesmo tempo. Agora eu reconheço que errava, por isso, pai, perdoe-me, por favor.
Eu sei que está sofrendo com a minha partida. Eu sei das promessas que fez enquanto chorava sobre o meu corpo. Não faça mais nada por mim, pai. Faça pelo senhor e por sua esposa. Eu aceitei nascer para ser o seu filho porque tínhamos histórias para escrevermos juntos, vivendo-as, mas o ponto final veio antes do fim e o nosso caderno está aberto. Procure ajuda pai, para poder entender os porquês disso ou daquilo; respostas virão e deverá estar preparado para elas. Aquela hora chegou. Fechou o que deveria ser fechado e o senhor não disse aquilo que teve a oportunidade de dizer, simplesmente, porque não sentia amor por mim. Sei que ele está descortinando dentro do senhor e quando ele estiver bem claro não grite como prometeu “Um dia eu vou gritar : Meu filho eu te amo.”
Pai, não grite mais com ninguém e nem para mim. Eu o ouço através da sua dor e é ela quem me transmite quem o senhor realmente é, permitindo-me perdoá-lo pai, porque a minha alma ainda é de criança. Sei do poder de perdão do Nosso Criador e Ele lhe dará, se permitir, as letras corretas para terminar a história da sua caminhada cujo sinal o senhor atravessou. Ele estava fechado; o senhor, embriagado. Bêbado mesmo. Lembra-se, pai?
Pai, o senhor ultrapassou muitos sinais: o da tolerância, do amor, da fraternidade e do respeito com os outros e consigo mesmo.
Ainda não é a sua hora, a minha também não era. Na trajetória que o espera carregará, sozinho, o fardo que cabia a mim ajudá-lo a carregar. Só que o peso, agora, pai, será bem maior, mesmo que eu queira sair, o senhor não conseguirá me tirar de dentro dele. Esta história, pai, borracha nenhuma apagará.
8 comentários:
Rita de Deus! Você extrapolou na lança. Suas letras caíram como óleo quente sobre muitos pais, mães intolerantes . Texto para reflexão. Obrigada
Matilde.
Dona Rita, às vezes os textos da senhora são comoventes. Esse seu texto como resposta, é uma lição a muitos. Muito bem escolhido pelo jornal, publicando-o bem próximo ao dia dos pais.
Rita, esse texto é bem espiritual. Traz uma mensagem muito profunda. Quantos livros ainda estão abertos e quantas cicatrizes também estão abertas esperando apenas um pedido de perdão ou um muito obrigado ou só - eu te amo. Cleonice.
Oi amiga! Saudades. esse texto me fez lembrar as nossas conversas de portão, lá em Araq., lembra-se?
Abração em todos aí.
Mariza
olá, Rita! sensacional a sua crônica.Parabéns pela sua sensibilidade !adorei e me retorna aos tempos em que nos bancos escolares interpretávamos esse poema que segue: Eu não o conheci
Meu filho foi embora e eu não o conheci. Acostumei-me com ele em casa e me esqueci de conhecê-lo. Agora que sua ausência me pesa é que vejo como era necessário tê-lo conhecido.
Lembro-me dele. Lembro-me em bem poucas ocasiões.
Um dia, na sala, ele me puxou a barra do paletó e me fez examinar seu pequeno dedo machucado.
Foi um exame rápido.
Uma outra vez me pediu que lhe consertasse um brinquedo velho. Eu estava com pressa e não consertei. Mas lhe comprei um brinquedo novo. Na noite seguinte, quando entrei em casa, ele estava deitado no tapete, dormindo e abraçado ao brinquedo velho. O novo estava a um canto.
Eu tinha um filho e agora não o tenho mais porque ele foi embora. E este meu filho, uma noite, me chamou e disse:
— Fica comigo. Só um pouquinho, pai.
Eu não podia; mas a babá ficou com ele.
Sou um homem muito ocupado. Mas meu filho foi embora. Foi embora e eu não o conheci.
Osvaldo França Júnior, As laranjas iguais. Rio de janeiro, Nova Fronteira, 1985
HÁ MOMENTOS QUE DEVEMOS APENAS DIZER:
AMO VOCÊ!!!
Esse texto realmente me impressionou, li poucos textos seus Rita e agora estou percebendo o quanto de sensibilidade com as letras vc tem, parabéns mesmo.
Antigamente eu não entendia o jeito da minha mãe me tratar, mas nos últimos anos ela mudou e vive me dizendo: AMO VOCÊ. Essas palavras de carinho, os momentos de atenção q meus pais me deram e ainda dão são essenciais pra mim, me sinto privilegiada, é pena q existam famílias sem esses diálogos.
Seus textos vão ficar guardados na mente.
Até mais...
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