Coluna "Mulheres" Jornal Folha da Região 21/03/2009
( Dia mundial da infância.)
Como ser mulher sem ter passado pela infância? Quantos anos você tem, mulher, mas quantos, da sua soma, já lhe roubaram? Roubaram a sua infância de menina sonhadora? Via bichos nas florestas e sentia medo, assombrações nas madrugadas, enquanto tinha que ser criança adulta. Hoje, é a menina da história, porém, na idade da loba.
“Vamos passear enquanto o seu lobo não vem.”
Na nossa época era permitido crianças trabalharem. Eu não sabia se gostava ou não, como também não sabia qual era o contrário disso. Morávamos na casa dos avós, nosso pai não dava notícias e coube à minha mãe nos sustentar, por isso, saíamos para trabalhar cedo e o nosso espaço no mundo, cabia a nós mesmas, mãe e filhas, conquistarmos. Trabalho dignifica o homem e emprego é assunto sagrado. Trabalho honesto nos dá o pão nosso de cada dia, amém! Concordávamos apenas balançando a cabeça.
E assim fomos virando máquinas, quanto mais nós nos doávamos, mais nos sugavam. Lei da oferta e procura. Coisa mais linda! Diploma era assunto necessário, mais do que o próprio estudo. Tenho um punhado deles nas gavetas. Filho nem pensar. Esse assunto era indiscutível. Ser mãe? Iria engordar, pesar mais do que 49, como hoje peso.
Trabalho é dinheiro e nós precisamos dos dois e com filho poderia perdê-los. Mas... Deus nos sonda. Acredite nisso! E eles vieram: O primeiro, em meu pleno despreparo de ser humano. O que fazer? Aprender, ué! Deixar de ser máquina para ser gente seria pular do ômega ao alfa. Uma megaoperação. Foi quando comecei a nascer. A cada dia com o meu filho eu ia me descobrindo junto, achava que Deus estava feliz com a minha dedicação e aceitamos com alegria a segunda filha. Foi quando eu nasci completamente. Meus filhos me deram a luz. Digo que “me nasceram” e me crio junto com eles. Mais eles me ensinam do que eu a eles. Palavras de coração de mãe! Claro, para não perder a pose, de vez em quando eu quero brincar de chineladas; eles, de esconde-esconde. São espertos e só aparecem na hora da comidinha.
Adoro brincar de casinha! Na minha casinha tem ferro elétrico, vassourinhas, rodinhos, baldinhos, tanquinho, panelinhas, mas só tem um fogão, porque na minha casinha o papai de todos adora brincar de comer fora. Fazer o quê, nem toda brincadeirinha é perfeita. Brincamos de professorinha e também de escrever textinhos. Na nossa salinha tem duas bicicletas, elas dão cavalo de pau, tem amarelinhas e cabana também. A bicharada vive esparramada sobre a mesa central, junto com o meu livro de capa azul. Ah, temos um cachorro também.
De vez em quando aparecem umas chatas de umas avós querendo atrapalhar o andamento da brincadeira da gente. Diz que não é assim, que não é assado, e que estou fazendo tudo errado, criança tem que ser criada com amor e dar a eles o que querem porque nós, quando éramos crianças, não tínhamos nada.
Pasmem! Ado, ado, cada um no seu quadrado! Que negócio é esse? Vai encher seus outros filhos, sô! Me deixa quieta, afinal de contas, rasgação de seda tem limites e não são todos os dias que o meu saco está vazio. Como disse acima, estou no meu estágio de gente, por causa disso tenho um montão de defeitos. Se tivesse continuado como máquina, seria tudo diferente. Não ouviria nem falaria nada. Enfim, como máquina estraga, eu, de quando em quando, também. Hoje, estou estragada e pronto!
Aí, para de ler esse texto, vai trabalhar, senão vai chegar atrasado, perder o emprego!
Hã? É sábado hoje, não trabalha!? É você que não trabalha! Você!!!! Já viu alguma dona de casa ter sábado, domingo e feriado? Me responde! Se tiver filhos então, pior ainda! Acabou! Nunca mais vai ter férias. Ah, não enche! Vai procurar no armário. Está pensando que sou sua empregada? Quer almoço? Vai pra casa da sua mãe! Aproveita e leva os seus filhos também! Vê se não me irRITA mais, heim! Estou com o saco cheio de vocês. Mas antes de saírem arrumem todos os brinquedos que eu também estou cansada de catar brinquedos esparramados. Estão ouvindo ou são surdos? Ah, vai gritar com a sogra! Acordei irRITAda hoje! Sumam da minha frente!
Nem sei por que dei esse texto ao título. Deve ter alguma coisa invertida nessa história. Confetes e purpurinas acabam e eu não dou conta de me manter no salto o tempo todo.
Tenho somente mais uma semana por aqui, como vou falar de tantas mulheres que sou em apenas uma semana? Se pudesse eu escreveria nas margens, mas não dá. Queria falar sobre as historinhas que eu escrevi para os meus filhos. Falar que o lobo mau é mau de verdade. Mas hoje a minha loba está atacada. Nem encoste em mim .
Aí, o espaço acabou, mas um pedacinho da história é assim: Respire fundo, estou calma agora! “ ... Eu sou um bebê, feito pra tua idade, brincar de boneca é tua realidade. O meu choro é brincadeira;, minhas risadas, pura verdade. Brincar de boneca, não é tempo perdido, se brincar comigo não correrá perigo [...] . no dia seguinte, após uma noite encantada, uma história infantil aconteceu. E a criança se salvou. Fim.”
Não cataram esses brinquedos aindaa!!!! Sumam já da minha frente seus filhos do meu marido... Levem o Lobo junto que eu não vou mais limpar o cocô dele por hoje.
Coitados! Fazer o quê, se eu não fizer assim de vez em quando, acabo perdendo o lugar no meu próprio quadrado.
Imagem: always_on_my_mind.blogs.sapo.pt
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