Dione era calmo; seu semblante, angelical. De seus olhos amendoados podia-se extrair brilhos multifacetários, e ele os multiplicava em suas doações, para enfeitar ainda mais os traços finais de sua cútis de porcelana.
Os lábios de Dione tinham contornos delicados e a cor de carmim exalava uma saúde inspiradora de onde fluía sorriso farto.
Os cabelos cacheados escondiam-lhe os ombros. A malha grudada na silhueta, mostrava peculiaridades expostas num corpo de mito. Assim a natureza o fez, assim a natureza o queria.
O Dione se fazia amigo dos colegas com uma força exagerada de se sentir igual. Dione era igual aos demais “diones”, embora os seus semelhantes o diferenciassem.
Em riste um, outro e tantos mais, foram os dedos que apontavam-no em julgamentos depreciativos.
Oh, Dione! Meigo Dione!
O tempo encurtava-se e as horas prometidas aproximavam-se. Seus passos delicados, outrora firmes, flutuaram sobre os ponteiros que marcavam o momento da dança no compasso das ameaças. Sem um par, Dione dançava no palco marcado com vara de giz.
Com a sua física indefesa, provou trocas de energias, perdendo de vez as suas partículas elementares. Castraram sua biologia, subtraíram-lhe sua igualdade.
Rasparam-lhe os cabelos, deram cabo àquele sorriso de paz. Os seus olhos injetados de sonhos foram chutados, fecharam-se diante de tanta impiedade.
Faixaram-no Jhonny. “Johnny Francis.”
Oh, Dione! Como eu o vejo, agora, nesse chão pisado e cuspido por “homens de fibra”?
Cadê você, meu amigo? A sua casa, o seu sobrenome, a sua identidade cadê?
Que vontade de abraçá-lo e protegê-lo, mas cadê você, meu irmão, nesses pedaços de corpo que eu vejo?
Ouça a minha canção, meu filho querido! Que eu cantarei a tantos como você. É um pouquinho do que posso fazer. Quero cantá-los.
Ah! Esqueço-me, sempre, que eu não sei cantar... Sempre mesmo!
A minha voz não é bela, o meu som não tem ritmo, mas eu quero tanto uma canção para você, meu esposo!
Vá, meu amante, ouvir a canção que palpitou no seu peito, e arregaçou as mangas do seu verbo de vida.
Vá, no balanço da alma, exalar o seu perfume sem mais e nem menos.
Vá, meu pai amado, celebrar o bailado da sua pureza. Da natureza foi parte integrante, mas quantos amantes não o conheceram no amor.
Oh, criatura perfeita! Em quantas canções ainda tem que gritar? Lá, no seu encalço, pregaram um decalque e prometeram arrancá-lo com a justiça das mãos.
Quem sabe no palco de Apolo um anjo lhe cante uma música. Porque na do homem, você dançou Johnny. Você dançou!
Onde estiver aprenda: antes de ir à guerra cante uma canção em louvor ao seu deus. Já sinto, companheiro! Já sinto, que no oráculo ouvirá melodias de amor.
Vá até ele, um deus o espera para brincarem juntos com um disco cuja canção não desfigure o seu semblante de gente.
Ouça canções, querido! Ouça canções.
Perdoe-me, Dione! Perdoe-me, mas eu não sei cantar.
Rita Lavoyer
18 comentários:
Você se superando a cada texto; nesse,poesia,psicanálise,amor ao próximo...enfim, não é um texto para ser lido uma vez ," apenasmente".Li várias vezes e acho que entendi...e quando isso aconteceu, ficou ainda mais bon ito.
SEU TEXTO SÃO PARA SER ABSORVIDO POR NOSSA ALMA AMIGA !
Vc me perguntou se eu fiz teatro? então segura: sou um ator Shaksperiano. No seminário tinhamos formação teatral. Entre outras peças, lembro de: Pueri Hebreorum ( os meninos dos hebreus}, Henrique IV, sonho de uma noite de verão, Barrabás ( eu era o tar). Sofraconãoamiga!!!!!!!
Vc sabe se o Picasso " parou"?
Rita, cada vez que passo por aqui fico mais encantando com seus textos, traz uma sensação muito agradável sempre.
Parabéns. Bjão.
Oi Rita,esse texto me comoveu,o ser humano sabe ser cruel com o outro.Quanto mais o outro sofre,mais o indivíduo se diverte,por isso,eu sempre digo:não somos a imagem e a semelhança de Deus,e sim os animais porque estes só ataca se for atacado,só rouba se não lhe der comida e não mata se não for para a sua própria sobrevivência.Você já viu ou ouviu falar que um animal hostilizou outro animal até este morrer?Com certeza não,mas já deve ter lido em algum lugar que isso já aconteceu com um humano.
Obrigada pelo convite.
Abraços,Lúcia
24/04/010
Agradeço o convite, Rita, só assim tenho a oportunidade (feliz)
de ler esta pérola. Escreve com uma sensibilidade especial...
Abraço
Olá Rita, conhecer seu blog foi entrar em contato com textos bem elaborados, obrigada pelo convite.
Quem disse que você não sabe cantar, Rita?
Cantou tão bem que me truxe preso, atento, do começo ao fim!
Muito bem estruturado o seu texto.
Parabéns!
Beijos
Jorge
Cara Rita,
Trato delicado das palavras que narram o drama...seu texto transita entre o profundo e o lírico.
Parabéns.
Genny
P.S. Se desejar, apareça em meu "Baú de Guardados"...sua visita será bem-vinda.
Que lindo texto ,profundo e li outros por aqui.Gostei muito!beijos,lindasemana e dia!chica
nossa ! estou com minha alma em frangalhos. menina que conto mais lindo ! envolvente ! que historia que mexeu comigo! estou sem palavras, diante da realidade que vejo aqui.. como alguem pode se achar no direito de agredir alguem mesmo em palavras só porque a pessoa é "diferente"? é cruel.. parabens.. beijos
Olá Rita, estou indo e você como está? Saudades
Beijos e abraços
Amei as histórias postadas no seu blog. Há um lado angelical,infantil em seus textos. Excelente, um abraço.Se quiseres vivitar o meu é: blog da prof sagave, porém voltado à escrita de alunos o que o teu blog pode contribuir através da leitura.
Oi, Querida Rita, estou aqui.
Encontrei belos escritos, de narrativa gostosa de ser absorvida. Estarei lhe visitando e comentando. Conto com suas visitas e comentários. Curto bastante a reciprocidade.
Bjs.
Oi, Rita!
Obrigada pelo convite para conhecer seu blog cheio de lirismo e delicadeza.
Um beijo e uma semana bem feliz.
Rita, minha alma se encanta com seus contos. belissimos...
abraços.
Rita,
achei excelente o teu blog. Ele tem mais uma seguidora.
Obrigada pelo convite.
Teus textos são maravilhosos.
Abençoada semana!
Abraço.
Nossa, me surpreendi coma delicadeza e sutilidade das palavras que você escreve.
Passa sentimento, sensações!
Parabéns Rita!
Votarei sempre por aqui!
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