“um rio precisa de muita água em fios para que todos os poços se enfrasem: se reatando, de um para outro poço, em frases curtas, então frase e frase, até a sentença-rio do discurso único, em que tem a voz a seca que ele combate.” João Cabral de Melo Neto- 3
Apresentar os textos inscritos no espaço urbano, os chamados grafites, serve-nos para postular a importância de analisar as várias manifestações humanas que se organizam na produção de sentidos.
Além disso, o estudo pauta-se em repensar a língua e a linguagem, assim como Fiorin, em Elementos de Análise do Discurso , evidencia em sua obra :
“ O texto pode ser abordado de dois pontos de vista complementares. De um lado, podem-se analisar os mecanismos sintáticos e semânticos responsáveis pela produção do sentido; do outro, pode-se compreender o discurso como objeto cultural, produzido a partir de certas condicionantes históricas, em relação dialógica com outros textos”. 4
A escolha desses textos grafitados nos muros e paredes das cidades, projeta às novas formas de interpretação e estudos de textos da língua portuguesa; os textos e/ou manifestações textuais de sentidos, extravasam o papel, a moldura, o limite do olhar. Não se pode mais analisar textos desconsiderando o enunciador, o que a enunciação e o enunciado permitem contextualizar e dialogar com o mundo, com o espaço, com o enunciatário.
O texto referencia o pensamento humano. Os grafites, esses textos pintados através do spray, do pincel, das tintas, muitas vezes explicam a vivência deste mundo vivido, descrevem os distintos modos de vida, mostram as expressões significativas da linguagem, tanto de uma cidade como São Paulo, Rio de Janeiro e outras do território mundial. Assim como a análise dos seus discursos, os grafites devem receber um tratamento especial da sociedade, e sua concretização passa a influenciar novos modos de vida das gerações, extrapolando as fronteiras territoriais urbanas, mesmo porque constituem traços de uma identidade do enunciador.
Por isso, apresentamos o estudo da análise do discurso dos textos dos grafites espalhados na topologia urbana, a partir do percurso gerativo de sentido. É no percurso gerativo de sentido que identificamos a disposição de seus componentes e como eles se relacionam uns com os outros.
Percurso gerativo de sentido tem a definição:
“O percurso gerativo de sentido é uma sucessão de patamares, cada um dos quais suscetível de receber uma descrição adequada, que mostra como se produz e se interpreta o sentido, num processo que vai do mais simples ao mais complexo”. 5
Para proceder a análise de um texto a partir desses patamares que vai do mais simples ao mais complexo, a semiótica discursiva é um instrumento que nos possibilita compreender o texto, analisá-lo e interpretá-lo, e como ele é concebido, ou seja, como resultante da articulação entre dois planos que o estruturam e que funcionam correlacionados: o plano da expressão e o plano de conteúdo.
O plano do conteúdo é onde as oposições básicas fundamentais são concretizadas em forma de objetos e valores, além de serem figurativizados e tematizados. Nesse plano são apreendidos os efeitos de sentido produzidos e reiterados pelos formantes e suas disposições e inter-relações.
No Dicionário de Semiótica, o plano de conteúdo é o plano onde nasce a significação das variações culturais do texto:
“O plano do conteúdo é o plano onde a significação nasce das variações diferenciais graças às quais cada cultura, para pensar o mundo, ordena e encadeia ideias e discurso.(...) O termo conteúdo é assim sinônimo do significado”. 6
O outro plano que compõe o estudo do texto é o plano da expressão, que corresponde ao modo de manifestação e concretização do plano do conteúdo em uma forma única, composta por substâncias heterogêneas da expressão do verbal escrito, do visual tipo: tipografia, projeto gráfico do visual (pintura, desenho com sua dimensão plástica), formado por texturas, volumes, bem como as dimensões dos diferentes suportes: muros, paredes, postes, viadutos. Tomemos a definição do plano da expressão seguindo o Dicionário de Semiótica:
“Na esteira de L. Hjelmslev, denomina-se plano da expressão o significante saussuriano considerado na totalidade de suas articulações(...) O plano da expressão está em relação de pressuposição recíproca com o plano do conteúdo, e a reunião deles no momento do ato de linguagem correspondente à semiose”. 7
É da relação estrutural orgânica entre os dois planos, cuja relação de pressuposição recíproca está sempre implicada num texto, que depende, segundo a semiótica discursiva, o percurso gerativo de sentido.
Trabalho sobre Grafite - Pós-graduação em Linguistica-semiótica -Campus Unesp-Araraquara.
3- FIORIN, José Luiz. Elementos de Análise do Discurso. São Paulo. Editora Contexto.2002, p.39
4 _____ Op.Cit. p.10
5 _____ Op. Cit. p. 17
6 GREIMAS, ªJ., COURTÈS, J. Op. Cit., p.81
7 ________.Op.Cit .p.174.
2 comentários:
A acadêmica Rita é tão competente quanto a cronista. Muito bom! Um beijo pra você.
Oi sumida, passa lá no meu blog...
hahahahahah
Postar um comentário