Exploramos o mundo à nossa volta com os órgãos dos sentidos. Eu sei que consigo sentir através da minha visão, saborear com o tato prazeres e angustias. Quantos remorsos degustamos ao engolirmos sapos que cheiram tão mal aos nossos estímulos, mas os fazemos, calados.
Não foram nem uma, nem duas vezes que toda a escola ouvia gritos de alunos, porque estavam apanhando das mestras. Na minha sala, eu tremia junto com alguns, enquanto outra metade da classe incentivava, aos gritos, aquelas torturas.
A minha professora avisava, gritando, que aquilo deveria nos servir de exemplo. Diante de tamanha coação, ficávamos imóveis nas carteiras.
_ E aí “Pimentão”, apanhou hoje, hein!
Ouvi isso na saída. Um grupo de colegas de classe zoava o “Pimentão”, porque ele havia apanhado, dentro da classe, da professora, cujo nome não citarei, porque ela ainda vive.
Ele ficava vermelho, igual a um pimentão mesmo, quando o irritavam. Por isso, herdou o apelido. E o constrangimento o acompanhava até que findasse o seu caminho de retorno à casa, talvez deixasse a vergonha do lado de fora, quando a adentrasse, batendo a porta. Talvez...
No dia seguinte a rotina era a mesma, os encontros acontecendo e aquele menino, apenas “Pimentão”, animando a garotada. Eu gostava da alegria dele, embora não soubesse o seu nome. Apenas uma criança simples. Apenas.
Naquela saída eu o vi mais vermelho do que antes. Os “amigos” o chacotearam. Falavam de outra surra que levou da professora porque era ‘burro’, não decorara a tabuada. Engraçado! Não ouvimos os gritos do alegre “Pimentão”. Apanhara em silêncio desta vez?
Nunca mais o vi. Não havia mais o “Pimentão” naquela leva que se juntava à outra. Não sei para onde ele foi. O ano, tenho certeza, ele não terminou naquela escola. Desvencilhou-se aquele “Pimentão” da rotina escolar.
Acovardou-se ou teve coragem de fugir de si mesmo por terem lhe roubado a sua autoestima, a sua alegria simples de apenas ser o que realmente era?
Com variedades, os pimentões são ligeiramente picantes. Alguns dizem que quando os comem, lembram-se deles o dia todo. Cada um os digere conforme o funcionamento do seu organismo, por isso uns os saboreiam; outros, não.
O pimentão, enquanto uma hortaliça, meu organismo o aceita muito bem. Mas os meus sentidos, convertidos em impulsos elétricos e que transitam o meu Sistema Nervoso Central, me fazem ouvir os sabores daquele “Pimentão” que gritava aos olhos de tantos e que nada faziam para amenizar o seu flagelo, a sua angústia, a sua vergonha, a sua humilhação. As dores daquele menino eu ainda as vejo, eu ainda as ouço, mas eu não as digiro
Lutar contra a prática de bullying em qualquer espaço do planeta é questão de dignidade.
Bullying já é questão de saúde pública.
Não podemos nos calar diante dessa covardia disfarçada de brincadeira.
BULLYING NÃO É BRINCADEIRA !
JUNTE-SE A ESTA CAUSA!
Rita Lavoyer
2 comentários:
Plenamente de acordo, Rita! BULLYING sempre existiu. Era tido como chacota, "os castigos dos pais e dos professores" era para educarmo-nos! Incrível como todos sofremos com tamanha "gozação" por nossa cor, tamanho, inteligência, classe social, etc... etc... Até hoje imperam. Agora tomaram o rumo mais psicopedagógico de enfrentamento por "algumas autoridades educacionais", mas ainda ferem e muito! "Atire a primeira pedra quem nunca passou por isso ou fez alguém passar"... Eu, por exemplo, por ser baixinha era assim chamada: anãzinha, ou pintora de rodapé; por usar bota ortopédica chamavam-me de botinuda... E, como eu chorava... Resisti e passei por isso sozinha, com minhas armas de não me importar, não dar atenção e aos poucos foram me esquecendo... Incrível que ainda hoje há educadores e familiares mal informados nesse item marginalizante - o Bullying!
Bj. Célia.
Obrigada por mais esta força, Célia!
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