“Quando aquele corpo, embora sendo seu, jazer em outra cama, deixa, Senhora, que chorem sobre o seu cadáver.
Quando aquele corpo, já tão frio e seu, e elas, ali paradas, querendo sobre ele chorar, deixa que chorem sobre o seu cadáver.
Quando o seu cadáver, já ex-são, embora seu, jazer tão frio, deixa, Senhora, o palco livre que outros, ali, chorem o seu cadáver.
Quando aquele cadáver, em palco livre, já chorado pela Senhora, por elas e por todos, pedirei que me deixe chorar sobre o seu cadáver, agora homem meu, que jaz no palco que para mim nunca fora livre.
Deixe-me chorar sobre o corpo quente desse seu, e sempre meu, que todos, embora o olhassem, não sentiram o quente corpo, como nós, Senhora, sentimos.
Quando o seu corpo, embora meu, tão quente e firme, deitado à cama, e eu sobre ele deslizar, deixe-me, Senhora! Deixe-me, Senhora! Outrora seu, também tão meu, ainda meu, tão quente e firme, suave e belo. Deixe-me, Senhora!
Deixarei minha alma chorar, porque ela sente o quente da alma dele, ainda viva dentro de mim. Viverá para sempre nesta minh’alma que se completa agora que o terei eternamente meu.”
Amada! Tracei essas palavras e as costurei aos moldes do seu luto. O maior Homem do mundo também foi amado e também morreu. Abrace a dor que lhe cabe, pois é à ela, à Senhora, que ficarão os filhos e outros bens. A você? O vazio, a saudade e os dedos em riste. Suportará, por certo. Suportou tanta ausência. Fez de lágrimas, sorrisos para alegrá-lo, elevá-lo.
O ajudou, tantas vezes, a voltar para casa fortalecido para suportar o que lá o esperava. Se ela foi uma Senhora Dama e você foi uma dama de companhia, não importa agora. O que importou foi o quando se encontraram, se entrelaçaram, se descobriram e se amaram. Os semelhantes possuem suas diferenças, quanto mais nos aproximemos deles, tantas mais as descobrimos. Se você foi o efeito, procurar a causa aonde? E não é assim: “Pessoa tão boa, de tantas qualidades. Por que tinha que morrer?”
Quem sabe das qualidades ou dos defeitos? Quantas ele não deve ter aprontado lá, e você não soube, Amada, até que ele chegasse aos seus braços? Ou pior, em quantos braços ele já não deve ter passado antes de chegar aos seus?
Mas se você acha que será a última, pois não há mais tempo a ele, proporciona-lhe um dia de amor, diga-lhe tudo de bom que traz em sua alma e o faça plenamente feliz para que, entre beijos e gemidos, ele alcance os seus ouvidos e confesse ter sido você, embora tarde, a razão da passagem dele nesta vida.
Depois, continue vivendo. A partida deverá ser dele e não sua. Lembrando: espécie desse tipo dá em pencas a um precinho de ocasião.
Seja amante, mas não se esqueça de que é Mulher.
Rita Lavoyer é membro da Cia dos blogueiros e da UBE
3 comentários:
Faz-me lembrar o Palhares, aquele personagem de Nelson Rodrigues, um rematado moleque e canalha "que não respeitava nem a cunhada".
Existem muitos Palhares soltos no circo. Engraçadinhas também, óbvio, fazem parte do gênero humano.
Abração,
Jorge
... Infelizmente... é ao que se presta o ser humano... em muitas situações... alto é o preço dessa temperatura!
Bj. Célia.
Que texto lindo. Uns dos seus melhores textos, se não for o melhor. Parabéns! Tão lindo, que nem tive coragem de brincar.
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