Minha 91ª classificação liter aria. Revista SerEsta SOBRE A vida e a obra de Casimiro de Abreu
O meu corpo não está na rede – Rita de Cássia Zuim Lavoyer
Casimiro, “Miro” para
mim, gostava tanto dos nossos encontros, quando colhíamos mangas e pitangas naquelas
tardes fagueiras, às sombras das bananeiras... Ah, que saudade que tenho da
aurora da nossa infância! Cresceste, “Mirinho”, e não entendeste que promovi
aquele encontro, deitando-me na rede, debaixo da laranjeira, a tua espera?
Sabia que eras um “fraco vagido”, mas justo “nas horas ardentes do pino do dia”, eu, com sede, imaginavas o
céu por dossel? Eu ali, queimando de calor e tu, com teu romantismo nostálgico,
valorizando o bucolismo, observando o meu colo, o meu palpitar, a minha boca
entreaberta e nada, nada de provocar um toque?! Querias chegar “sem leve rumor”
mas te ouvi os passos, sabia que estavas a me contemplar. Como pudeste dizer em
versos que me falaste de amor? Não me disseste uma palavra! Miravas-me na rede,
praticavas o teu voyeurismo e me expuseste, dizendo ao mundo que “debaixo
das roupas batia-lhe o seio no seu palpitar!” Como sabias? E mais: “no sonho de
amores chamava por mim”. Que calúnia! Miro, ainda estou lá, naquele bosque. As
flores que me cercavam, secaram. Na verdade, nem flores eram, teus olhos de
poeta romântico transformaram moitas de capim em algo mais poético. Próprio dos
fingidores. A rede nem era minha, nem era de pena. Era do “Metastásio”. Não me
tocaste um dedo. Inventaste fatos que sequer aconteceram sobre a rede. Sei, eu
tinha amor, tu, medo. Queria reviver aquele encontro, para tornarem verdadeiros
e palpáveis os teus versos. Mas o meu corpo não está na rede. Só minh’alma
ainda está. Venha, Miro, mas venha mais irônico; vivos, o ultrarromantismo
separou nossos corpos. Quem sabe agora, sem eles, gozaremos o teu amor
platônico.
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