Por Rita Lavoyer
Como
numa visão de raio X. Foi assim.
A
mulata trazia em seus olhos uma máquina que comia carnes. Tudo o que podia ver
não passava de grades enferrujadas, enfim. Todo o espaço ao seu redor era
geometricamente quadrado. Estava ali, mas jurava inocência.
Não
fora ela a responsável por aquele pacote na sua maleta. Não se sabe, até hoje,
quem colocou aquela droga para incriminá-la. Foi conspiração!
Ela suspeita daquela loira oxigenada que vivia
dando em cima do Negão. O Negão era dela, ela o havia conquistado. Batalha
dura.
Mulher de garra, não ia perder o seu homem
para uma oxigenada. Ela odiava as oxigenadas, as julgava mulheres fracas e de
carne fria. Não sabem nem delas, quanto mais de um homem. Tinha opinião
formada. Porém algumas estão livres. Ela não é oxigenada, é mulher original, do
jeito que veio ficou. Mas não foi ela, jura que não foi. Ela só queria o Negão, assim o chamava.
Mas a oxigenada não dava sossego àquele homem dela.
A
mulata jurava eliminá-la diante de uma plateia. Muitos a ouviam. Foi
conspiração, ela tem certeza.!
Está
presa injustamente, junto a outras tão injustamente presas. O
Negão está enquadrado também. Ele queria aquela mulher com suas garras, e de
carne quente, e outras também.
As
visitas aconteciam, mas aquela de garra não recebia quem ela gostaria de ver.
Ele estava longe dali, mas em qual pavilhão? Era a questão que ela queria
desvendar.
“
Elas são mulheres falsas e não têm alma de mulher. Os olhos delas não são de
mulher, penetram o corpo da presa estraçalhando as entranhas. É assim que eu
vejo as oxigenadas. Quem não se aceita como é, não é mulher.”
Não
se cansava de repetir sua versão às companheiras de cela que já não eram mais
oxigenadas por não haver, ali, o necessário para a tintura.
-
Vai chegar uma novata hoje. Não queremos
confusão por aqui!
Respeitou
aquela carcereira tão oxigenada quanto a sua inimiga.
A
novata – ela – veio insinuando sua
silhueta de serpente. Uma a outra se avistaram e mostraram suas presas afiadas.
Estava mais loura do que quando pôs aquela encomenda na maleta da mulata, que
jurava estar presa injustamente.
Aquele encontro prometia uma guerra. Agora era
a oxigenada contra a mulher do Negão. Em honra à claridade de seus cabelos, a
falsa encostou-se na cela para provocar sua desafeta.
-
Estou grávida do Negão. Aconteceu
durante as visitas.
No
X de um instante a visão da mulata virou um raio e grades já não havia entre a
cela e o corredor. Os seus braços fortes e definidos atravessaram os ferros "inexistentes" naquele momento, agarrou-a. As unhas da mulher cravaram os ossos
daquela cobra que já estava com os cabelos tingidos esparramados no chão.
Atingiu os ossos daquele feto arrancando-lhe a carne, abortando-o ali mesmo.
Já
não havia mais filho do Negão, pois aquela presa foi abatida antes que ocupasse
uma vaga na cela.
Olhou
o seu desfecho esparramado naquele chão do corredor e não se abateu. Suspirou aliviada por provocar uma situação
que a colocasse, com razões, dentro daquele quadrado disforme às suas molduras.
Rita Lavoyer
Nenhum comentário:
Postar um comentário